Wlaumir Souza
Inquietante como o lugar social pode nos definir, restringir ou iluminar. E, neste ponto, o regime político no qual se vive ou se viveu ou se sonha viver pode, e muito, contribuir para uma perspectiva ou outra.
Inquietante como o lugar social pode nos definir, restringir ou iluminar. E, neste ponto, o regime político no qual se vive ou se viveu ou se sonha viver pode, e muito, contribuir para uma perspectiva ou outra.
50 anos após o
início do golpe militar – que surripiou o lugar do democrático, no Brasil, em
nome do medo imposto pelas armas da tortura como meio leviatânico de manter o
controle da propriedade enquanto forma de exclusão, exploração e dominação – ainda
ouve-se a pergunta se foi golpe ou revolução.
As respostas
continuarão as mesmas enquanto houver sobreviventes que se favoreceram,
enriqueceram ou destacaram-se a custa do ódio, da discriminação e da censura construída
pelo regime militar. Marciais saudosos e seus cúmplices na ocultação do real (além de cadáveres) e
de salários polpudos para o livre abuso do poder com estímulo estatal oficioso, alardearão que foi revolução em nome da “Família e de Deus”. Nem
é bom lembrar que “Homem de bem” foi um periódico nazista.
No outro
vértice, os derrotados de outrora – perseguidos, vilipendiados, torturados escorraçados,
presos ou degredados – e hora os
vitoriosos no regime, os republicanos democráticos (?) e outros tantos que não
tão simpáticos a este regime se deixaram seduzir pelo galgar da ascensão
social, política, econômica e cultural e que bradam, - Foi golpe!
Local comum dizer
que ao vencedor cabe dominar (escrever) a história, além das batatas. Assim, lemos livros que enaltecem
homens, brancos e heterossexuais em quase todos os espaços: do livro didático,
passando pelo jornal, aos meios de entretenimento mais populares ou
sofisticados. Todavia, se ainda, na segunda década do século XXI, a pergunta
persiste – foi revolução ou golpe? – demonstra-se por esta via que a vitória da
democracia republicana ainda não se deu por completa. E, talvez isto nunca
venha ocorrer enquanto dialética da história.
Num país
fraturado por uma separação de classes tão abusiva; com um racismo excludente
eficiente sem se institucionalizar ao impedir a ascensão social do outro, mesmo
com a criminalização do segregacionismo; e, de um machismo que encontra guarida até em despacho de
juízes mesmo após a conquista da tipificação realizada pela Lei Maria da Penha;
e estas leis são provas da condição de exceção ou segunda categoria de
cidadania concedida aos "segundos sexos" e ao "pecado da cor" que são arduamente combatidos pela mobilização social nacional
e o apoio de agências internacionais.
Enquanto estas
questões e tantas outras não forem resolvidas ou equacionadas estarão dadas as
condições para que o pensamento, o sentimento e a atitude autoritária,
ditatorial, mandonista, nazista, sexista, etnocêntrica, fascista, stalinista, entre tantas outras... ocorram. Em outros termos, somente quando a
democracia republicana se democratizar republicanamente em sua
universalidade emancipadora em favor das diversidades e pluralidades democráticas os
discursos mais sublimes deixarão de ser metafísica sem costumes.