Wlaumir Souza
Tempo e espaço
são determinantes inexoráveis da existência humana e enquanto tal da história e
da geografia que vivemos e construímos cotidianamente? Esta parece ser a questão
fundamental do filme X-men: dias de um
futuro esquecido. Paralelo a este
tema, segue a temática comum a todos os filmes da série: o direito a diferença,
ao singular, a diversidade, a pluralidade humano/existencial.
Note-se que o
velho embate entre o socialmente correto e o incorreto, ou o binário – quase
eterno – do bem e do mal faz parte de todas as tramas de modo a evidenciar que
humanos mutantes ou humanos sapiens não são neste quesito, como qualquer outro
animal racional do planeta, como preferiria classificar Aristóteles,
diferentes. Todos são
passíveis de algum tipo de morte, todos têm desejos e aspirações, sonhos e
amores e frustrações, desafios e aprendizagens e assim ad infinitum nas
características de ser e estar no mundo dos humanos. Para fechar este emblema
da filmografia todos os episódios têm final feliz para a Humanidade. Interessante
notar que neste quesito quase tudo que foi produzido pela humanidade na arte
tange pelo mesmo rio ao entrar e sair das águas, exceto os Gregos com suas
tragédias e alguns poucos ilustres da humanidade, para alívio de Heráclito e
pesadelo de Parmênides.
Um silêncio,
enquanto censura, se faz presente entre humanos sapiens e os mutantes: em nenhum
dos episódios o amor entre iguais: dois "homens" ou duas "mulheres". A questão de
gênero é petrificada nesta variedade mutante e sapiens da sétima arte. Um erro
pueril visto que a demanda é pelo humano universal do planeta, sem tirar nem
opor qualquer cizânia. E, este, possivelmente o maior limite desta série visto
que o horror que descrevem face ao outro é mais vista no que diz respeito à
mulher, ao negro e depois aos homossexuais em seu multicor de possibilidades
sexuais e de sexualidades. Assim, não por acaso, Wolverini é o personagem
principal – símbolo da masculinidade que tudo resiste e a tudo supera. O estoico
face as mais dilacerantes experiências da carne e da mente. O
negro é outro ser quase esquecido – há uma
exceção – mas, grosso modo, é mantido enquanto metáfora barata do mal
travestida de controle do bem na busca de conter o obscuro mal.
Nesta série
sobre o bem e o mau o pano de fundo são os Direitos dos humanos ou melhor os
direitos Humanos que servem a todos e em qualquer lugar no tempo após a sua
declaração e sob qualquer circunstância e para qualquer humano mesmo que tenha
negado para outrem esta dimensão. Em suma, a questão dos universais nos
valores. Deste prisma, enquanto Batman sofreu uma mutação ética, visto ser o
braço armado das elites onde o bem e o mal estão cristalizados; nos X-men, pelo
contrário, é enfatizado o dever ético contra todas as perspectivas de extinção.
Assim, a ética do dever tão cara a I. Kant sobrevive nos mutantes como retorno
do futuro corrigindo o passado, quase uma situação de TOC – da qual Kant era
uma vítima(?).
A ética do
dever encontra seus opositores sistemáticos em nome da ordem, e não por acaso
um anão. O anão representa várias metáforas: demonstrando que nenhum argumento,
por menor que seja, pode ser desprezado. O menor pensamento, encontrando o
tempo e o espaço adequado podem se tornar monstros criados pela razão e que se
tornam maior que ela e que o humano. O anão, Doutor Bolívar Trask – metáfora da
inquisição que sobrevive em moralistas, retrógrados, reacionários de todos os
naipes (dos religiosos aos comunistas passando pelos capitalistas) – demonstra
o quanto os saberes podem reconstruir práticas antigas de perseguição e
execução em massa em motes hodiernos defendidos em nome do “bem comum”.
No que tange
ao tempo – recurso explícito da trama -
o uso da imagem do rio com as ondas tenta demonstrar que o curso do destino
está traçado mesmo que possa ser abalado momentaneamente. Ou seja, “o destino,
o futuro e tudo” é determinado por uma corrente democratiana (o ser é) onde o
devir (Heráclito) é apenas aparente ou momentâneo demais para ser considerado
no curso da história, digo, do rio.
Os atores da
história estariam determinados pelas estruturas sociais das quais nada poderiam
fazer para serem de fato sujeitos da história? Esse o papel de Logan demonstrar
que ao “super-homem” tudo é possível, inclusive superar a tragédia do destino
em meio a angústia da possibilidade de ser livre. Ou, em outros termos, e num
outro ponto, a busca da cosmopolita comunidade humana poderá se tornar um fato
diante de grandes atores que superam os determinantes sociais, históricos,
geográficos, biológicos, para constituir a “paz perpétua”. Ao leitor e cinéfilo
atento deixo o convite para a reflexão.
Portanto, “Dias de um futuro esquecido” não remete apenas às memórias únicas de Logan e Charles Xavier, o professor X. Antes, o
futuro ao qual a Europa estaria destinada e que agora tem nos EUA seu principal
representante: a paz é possível para todos os humanos e disto não se pode esquecer
em momento algum da história, embora os oponentes desta diversidade possam dela
fazer questão de defender como caos da humanidade “verdadeira”. OU, pior, os que
defendem a "paz cosmopolita" não perceberem que sacrificariam o que seria o melhor de todos,
justamente todos numa sociedade cosmopolita e de paz.
O futuro esquecido é aquele planejado no passado e não vivido como a possibilidade que era. Ou, numa frase popularizada: o futuro já não é mais como era antes e cabe aos super-homens reconduzi-los ao destino “correto”: à “paz perpétua cosmopolita” Norte Americana. E, numa forma clichê – a criança e o velho em que te tornastes se orgulharia do “adolescente” que foras?
O futuro esquecido é aquele planejado no passado e não vivido como a possibilidade que era. Ou, numa frase popularizada: o futuro já não é mais como era antes e cabe aos super-homens reconduzi-los ao destino “correto”: à “paz perpétua cosmopolita” Norte Americana. E, numa forma clichê – a criança e o velho em que te tornastes se orgulharia do “adolescente” que foras?