segunda-feira, 21 de julho de 2014

O insulto como (por) elogio: postes e gratidão ou como o mandonismo sobrevive no Brasil.

Wlaumir Souza

                                                               A gratidão é um sentimento ancestral com laços na religiosidade e na política, com raízes profundas na cultura social e econômica, sendo típica das relações pessoais e privadas. Ser grato é uma das bases do mandonismo que vivemos na Terra Brasilis desde a Colônia e mantém Magalhães e Sarneys no poder... 
                                                               Leio aturdido, quase todos os dias nas redes sociais pessoas com grande notoriedade – inclusive intelectual – a alardear a importância da gratidão. Não notam a diferença entre gratidão e reconhecimento. A gratidão tem por séculos construído clientelas, apadrinhamentos e outras vertentes mais visíveis da corrupção. O ponto máximo nesta história de podre no Reino da Dinamarca foram os “religiosos” – em meio ao mensalão – serem gratos a Deus pelo espólio ilegal.


                                                               O esgarçamento da gratidão nas camadas mais populares tem se contra posto ao crescimento desta palavra nas frações de classe média. Também, esta se vê contra a parede face a uma população que tem despertado para o fato de que a gratidão é um dos móveis do imobilismo de classe, educacional e político. Diante das manifestações do “Não é só por R$0,20”, a camada média quer a gratidão, o beija mão e não o reconhecimento. O reconhecimento é público, profissional e em sua vertente mais pura seria impessoal.
                                                               A gratidão tem se arrastado pelo terreno do político e sua chama máxima tem sido a modernização conservadora desta via Partido dos Trabalhadores que pelo seu mandatário máximo – que se tornou personalista e o partido é apenas uma legenda como outras para suas decisões pessoais – fez eleger postes. Estes apareciam como a renovação e nada mais eram que dependentes pessoais. Eleitos postes pela ânsia da população de inovação, de reconhecimento de novas competências que nada mais eram que apadrinhados, em alguns casos, vazios.
                                                               Passado quase dois anos destes postes, a população os rejeitam – e isto vale da Presidência à vereança. Os desgastes são múltiplos: alinharam-se ao que tem de mais retrógrado em questão de moral e costumes, mas querem ser os modernos libertadores. Bandeiras tradicionais foram encapadas para facilitar o financiamento de tudo e todos. A resposta vem pela queda na aprovação dos governos e a possibilidade cada vez mais tangível da oposição se fazer eleger.


                                                               A população não quer mais gratidão. Quer reconhecimento. Reconhecimento de direitos e competências. Postes inúteis que reverberam em favor da inflação; dos costumes ultrapassados defendidos por religiosos ignaros do poder da história – inclusive em seu discurso caquético. A população sabe que a ingratidão é feita a cada mandato: algo igual ao que fizeram as velhas elites e que as novas parecem não se diferir.
                                                               Triste escolha a deste ano: entre a gratidão confessa e a dependência manifesta. Afinal, a gratidão pura e simples reconhece a ausência de méritos próprios e na dependência da gratidão vão de roldão todos os valores republicanos e democráticos em favor do familismo.


                                                               Para ser explicito: ficamos entre o mensalão que supera o familismo ou o tucanato com tradição familiar que perverte a República em linhagens que se pretendem ideologicamente profissionais?