Assisti admirado o avançar do
processo de impedimento da Presidenta Dilma Rousseff. Não tanto pelas acusações
de pedaladas – fato recorrente na política brasileira e agora legalizado pelo
sistema – mas, pelo modo como ficou claro a baixa qualidade de nossa
democracia. Mais que isto, o quanto está posto, em pleno século XXI, as
condições para aplicação e expansão do pensamento autoritário em nome do vil
metal.
A igualdade tornou-se um insulto
propalado em alto e bom som por uma parcela significativa da direita que quer
ter o direito de voltar a dizer piadas racistas, como se não lhes bastasse as
piadas homofobias, misóginas e xenófobas, entre outros quilates de preconceitos
e discriminaçõess como esteio da exploração econômica e marginalização social.
Vi espantado o desfecho do
impedimento. A plataforma básica é a ampliação da subjugação do povo com a
exploração máxima, ao ponto de restar apenas o bagaço humano sugado pelas
engrenagens capitalistas de usurpação da dignidade da pessoa humana.
Aposentadoria por volta dos setenta anos nos iguala a condição de escravizados
libertos pela lei do sexagenário. Para quase nada adiantava para a massa de escravizados
negros e mesmo para os septuagenários pobres que nasceram formalmente livres
nos séculos que vivemos será algo quase inatingível - o direito de retorno de
seu trabalho feito pelo bem do País.
Pior que isto, para sustentar a
pirâmide dos privilégios dos altos postos do Estado e de empréstimos com
incentivos fiscais e crédito subsidiado aos capitalistas cortará direitos
sociais que por esta paragem chegou há menos de duas décadas. Pouco o povo
desfrutou do fato irrefutável de que a maior riqueza de uma nação é seu povo e
logo será jogado à indigência de políticas famélicas, tão tradicionais na Terra
Brasilis, ao gosto dos autoritários de que naipa político seja da América
Latina.
Vivo desolado com o triste fato
de sobeviver a ponto de passar por tempos temerários onde o direito pode
tornar-se uma exceção, concedida aos partidários, aos burocratas e aos
financiadores do último golpe parlamentar que ainda não se assumiu com tal.
Ainda vivemos sob uma democracia formal que aos poucos vê apagar as chamas da
igualdade, da liberdade e da hipótese da fraternidade.
Vemos um golpe que se revela aos
poucos, insinuando-se qual sedução vista em sinais sóbrios, porém soturnos. A
maior marca de Caim pode ser vista avultar-se logo após o fechamento do ciclo
iniciado em 17 de abril: as prerrogativas de advogados sendo pisoteada pelas
botas de diferentes modos: apanhando no meio-fio; impossibilitado de se
comunicar com as vítimas presas em manifestações contra o presidente; detido em nome da ordem. Trieste tempo onde a
OAB sente na própria pele as dores de ter aderido a nova ordem por meio do
apoio ao impedimento parlamentar formalmente estabelecido.
Assim, vejamos, quanto tempo será
gestado para que, como na Ditadura, se escancare a realidade com frese
semelhante a do Ministro do Trabalho e da Previdência Social Jarbas Passarinho,
na reunião, em dezembro de 1968, que aprovava o AI-5: "Sei que a Vossa Excelência repugna, como a mim e a
todos os membros desse Conselho, enveredar pelo caminho da ditadura pura e
simples, mas me parece que claramente é esta que está diante de nós. [...] Às
favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência”.
Até mesmo o pensamento
autoritário precisa de uma preparação para ser implementado. Entre nós o ponto
de partida seria o slogan espalhado pelo Brasil a fora “Não pense em crise.
Trabalhe”? Síntese de um projeto ao qual interessa corpos trabalhadores,
escravizados e sem a interferência do Estado no mercado via leis trabalhistas,
e com mentes vazias de ideias e ideais democrático-sociais viabilizados pela
educação formal, visto que esta seria controlada pela “Escola sem partido” que
seria a de partido único, a do opressor-explorador-dominador pautada pela
patrulha ideológica do básico ao universitário?
Apesar do dia triste que foi o do
impedimento... a democracia vencerá os tempos de temerários e a chama da
justiça será vista brilhando nos luzeiros das estrelas como esperança se
concretizar nos mais triviais dos dias aos de mais temor.